(Foto: Reprodução/TV Globo |
MARIA INEZ RODRIGUES PEREIRA
O resultado da prova de
redação do Enen 2014, com quinhentos e vinte e nove mil alunos zerando na redação,
ou seja, 8,5% do total de candidatos participantes, de acordo com o Inep,
retrata uma triste realidade na educação de nosso país. Infelizmente, estamos
formando uma geração de indivíduos que não sabem ler, escrever, pensar por si
só, opinar...,ou seja, uma geração alienada. Além desses estudantes que zeraram
na prova de redação outros duzentos e quarenta e oito mil estudantes tiveram
suas redações anuladas, porque fugiram ao tema proposto. No entanto, a culpa
não é apenas dos professores, mas é consequência de uma série de fatores que têm
contribuído para essa situação.
Já dizia
Suchodolski(1976) em análise aos textos de Marx sobre ideologia que “[...]a
educação é um instrumento de fortalecimento do poder de classes na sociedade
classista, porque propaga uma ideologia adequada a ele”. E isso ficou evidente
com o resultado do Enen, confirmando a teoria de Suchodolski de que nossa
educação ( ou nossas escolas) está trabalhando a favor de uma classe dominante
que deseja se manter no poder, impedindo que a educação de qualidade seja
ofertada a todos. Esse resultado da prova de redação, só demonstrou o quanto
nossos jovens estudantes estão sendo alienados por uma educação fracassada,
reféns de uma ideologia dominante.
Infelizmente, as
práticas pedagógicas realizadas nas salas de aula, com prevalência apenas ao
uso do livro didático, pouco tem levado nossos estudantes a pensarem
criticamente os assuntos econômicos, sociais, políticos, históricos,
filosóficos e das artes. Que dirá
escrever criticamente sobre um tema (publicidade infantil) do qual nem conhecem
ou tenham ouvido falar.
De acordo com as
Diretrizes Curriculares da Educação Básica é de competência (ou função, como
queiram alguns) da escola dar condições para que o aluno aprenda e possa se
desenvolver plenamente. Entretanto, aprender requer sacrifícios que exigirão do
estudante e, também, do professor, muita leitura, muita escrita, muito
“estudo”, muita pesquisa. E hoje, esses sacrifícios estão sendo substituídos
pela informação rápida e sem muito esforço,
dando apenas um clic na internet.
Indiscutivelmente uma
condição que está contribuindo muito para esses resultados é a formação de
professores, quase sempre muito falha. De acordo com o educador Saviani(2008)
os cursos de formação de docentes que não articulam teoria e prática a partir
da pedagogia histórico-crítica, com base no materialismo dialético, não terá
condições de intervir no objeto de ensino de modo intencional. Ou seja, para o
autor “se um curso é teórico, não é prático, e, se é prático, não é teórico”.
Desse modo, o objetivo da educação que é instrumentalizar o aluno para que este
desenvolva a capacidade de ler, compreender e transformar a realidade na qual
está inserido, acaba sendo prejudicado pela má formação do professor.
A formação docente no
Brasil ainda é muito deficitária, pois não prepara o professor para ser
pesquisador e produzir novos conhecimentos, mas sim para reproduzir conceitos e
conteúdos que em nada ou quase nada contribuem para a transformação intelectual
e social do sujeito que aprende. Há de
se reconhecer que muitos são os desafios que impedem o avanço educacional da
população brasileira. E um deles, o qual eu considero preocupante, é a falta de
investimento na qualidade do trabalho pedagógico. Essa qualidade está associada
à valorização do professor com salários mais dignos, com formação adequada e
satisfatórias, com melhorias nas condições de trabalho na rede escolar ( que em
alguns lugares é precária),com equipamentos que realmente funcionem e que sejam
necessários ao ensino. Enquanto esses investimentos não forem aplicados
adequadamente (sem desvios) nas escolas e na educação, continuaremos assistindo
esses resultados tristes e humilhantes para o nosso país.
Uma nação não se
desenvolve completamente sem uma boa educação. Basta olhar em volta e verificar
os avanços obtidos pelos países mais desenvolvidos do mundo. Com certeza, a
prioridade desses países foi, sem dúvida, a educação.
A luz amarela de
alerta, já está acesa há um bom tempo. E essa aparente consequência de uma
educação que está na linha da falência, precisa urgentemente de mudança. É
preciso reconhecer que nossa educação não pode ficar atrelada apenas a força do
capital. Formar cidadãos para as exigências do mercado é um grande erro, pois
obriga a escola a cair no pragmatismo imediatista e irracionalista de formar
pessoas para o mercado de trabalho e não para sua humanização integral. Esse
tipo de pedagogia está levando ao empobrecimento dos conteúdos curriculares,
bem como a secundarização do papel do educador
tendo como consequência os resultados absurdos na prova de redação do
Enen, bem como no resultado de outras avaliações, tanto internas como externas,
nas escolas de todo Brasil.
A mudança de paradigma
metodológico começa na própria sala de aula, a partir do compromisso do
professor com a formação de seu aluno seja ele quem for, independentemente de
recursos financeiros, didático-pedagógicos, tecnológicos ou de infraestrutura.
O fato é que, a escolha
por uma educação alienante ou revolucionária estará sempre nas mãos do
professor. É o professor quem decide se quer um aluno consciente e crítico ou
alienado e passivo.
Suchodlski (1976) já
alertava em seus escritos que
A
educação nas mãos da classe dominante é uma arma, um dos meios mais importantes
para conservar o seu domínio e impedir o seu derrube, mantendo a psique humana
livre de todas as influências que surgem pela transformação das forças
produtivas. Nesse sentido, a educação apresenta-se como influência destinada a
defender os interesses da ordem decadente em franca contradição com a educação
que se concebe como verdadeiro processo de formação
de novos homens no desenvolvimento histórico das forças produtivas. No
primeiro caso, a educação é um instrumento de opressão de classe, no segundo,
pelo contrário, um elemento de autoprodução dos homens no decurso do seu
trabalho produtivo histórico. A contradição entre ambas as formas de educação
reflete a oposição existente na história entre o desenvolvimento revolucionário
e criador das forças produtivas e a força retardadora das relações de produção.
Essa contradição é particularmente aguda na época do capitalismo. (1976, p.95)
Portanto, o trabalho
pedagógico, bem organizado e planejado pelo professor, pode contribuir para uma
educação emancipadora e revolucionária que ajude o estudante a formar
consciência crítica sobre tudo, ou simplesmente, contribuir para a sustentação
e legitimação de uma situação opressora e de exclusão social.
Os quinhentos e vinte e
oito mil estudantes que obtiveram nota zero (0,0) na redação do Enen 2014, com
certeza estão inclusos na segunda opção.
Para muitos
especialistas, isso é apenas consequência de um ensino falho e sem perspectivas.
Para nós educadores compromissados com uma educação de qualidade, é um desastre
que mancha nossa alma e fere nosso coração.
REFERÊNCIAS
DUARTE, Newton(org.)
Critica ao fetichismo da individualidade. 2.ed.rev.-Campinas SP: Autores
Associados, 2012
MEC, Ministério da Educação.
In: http://g1.globo.com/educacao/noticia/2015/01/mec-divulga-notas-do-enem-2014.html
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